17 de mai. de 2015
CAPÍTULO SETE - DESCOBRINDO QUEM SOMOS REALMENTE 7.9.6 - NO UNIVERSO EXTERIOR ASSIM COMO NO UNIVERSO INTERIOR
CAPÍTULO SETE - DESCOBRINDO QUEM SOMOS REALMENTE 7.9.6 - NO UNIVERSO EXTERIOR ASSIM COMO NO UNIVERSO INTERIOR
Ao erguer os olhos para o céu claro à noite, você pode compreender com a maior facilidade uma verdade que é ao mesmo tempo simples e extraordinariamente profunda. O que é que você vê lá em cima? A Lua, os planetas, as estrelas, a faixa luminosa da Via Láctea, quem sabe um cometa ou até mesmo a vizinha Galáxia de Andrômeda a 2 milhões de anos-luz. Sim, mas, simplificando ainda mais, o que você vê? Objetos flutuando no espaço. Então, o que forma o universo? Objetos e espaço. Se você não fica sem palavras ao voltar seus olhos para o céu numa noite clara, então não o está observando de verdade, não está consciente da totalidade do que há ali. Provavelmente, está focalizando apenas os objetos e talvez tentando nomeá-los. Caso alguma vez você tenha se maravilhado ao olhar para o espaço -e talvez até sentido um profundo respeito diante desse mistério incompreensível -, isso mostra que abandonou por um momento seu desejo de explicar e rotular e se tornou consciente não só dos objetos como da profundidade infinita do espaço em si mesmo. Deve ter permanecido silencioso o bastante em seu interior para notar a vastidão em que esses mundos incontáveis existem. O sentimento de admiração não decorre do fato de que há bilhões de mundos ali, mas da profundidade que contém todos eles. Não conseguimos ver o espaço, é claro. Também não podemos ouvi-lo, tocá-lo nem sentir seu gosto e seu cheiro. Então, como somos capazes de saber que ele existe? Essa pergunta aparentemente lógica contém um erro fundamental. A essência do espaço é a imaterialidade, portanto ele não "existe" no sentido convencional da palavra. Apenas as coisas - formas - existem. Até mesmo chamá-lo de espaço pode ser enganador porque, ao nomeá-lo, nós o transformamos num objeto. Vamos considerar da seguinte maneira: existe algo dentro de nós que tem afinidade com o espaço, e é por isso que somos capazes de ter consciência dele. Consciência dele? Isso não é totalmente verdadeiro também porque, como podemos ter consciência do espaço se não existe nada lá de que possamos ter consciência? A resposta é ao mesmo tempo simples e profunda. Quando estamos conscientes do espaço, não estamos de fato conscientes de nada, a não ser da consciência em si - do espaço interior da consciência. Por nosso intermédio, o universo vai se tornando consciente de si mesmo! Quando o olho não encontra nada para ver, essa imaterialidade é entendida como espaço. Quando os ouvidos não encontram nada para escutar, essa imaterialidade é compreendida como silêncio. Quando os sentidos, que existem para perceber a forma, encontram a ausência da forma, a consciência sem forma que está por trás da percepção e torna possível toda percepção, toda experiência, não é mais obscurecida pela forma. Quando contemplamos as profundezas insondáveis do espaço ou escutamos o silêncio nas primeiras horas do dia logo após o nascer do Sol, alguma coisa dentro de nós faz eco a isso como um reconhecimento. Então sentimos a enorme profundidade do espaço como nossa e sabemos que esse precioso silêncio que não tem forma é mais essencialmente nós mesmos do que qualquer das coisas que formam o conteúdo da nossa vida. Os Upanixades, os antigos textos sagrados da índia, referem-se a essa mesma verdade com as seguintes palavras: O que não pode ser visto pelos olhos, mas por meio do qual os olhos podem ver, é unicamente Brama, o Espírito, e não o que as pessoas aqui adoram. O que não pode ser escutado pelos ouvidos, mas por meio do qual os ouvidos são capazes de ouvir, é unicamente Brama, o Espírito, e não o que as pessoas aqui adoram... Aquilo que não pode ser compreendido pela mente, mas por meio do qual a mente consegue pensar, é conhecido unicamente como Brama, o Espírito, e não o que as pessoas aqui adoram. Deus, diz o texto sagrado, é a consciência sem forma e a essência de quem nós somos. Tudo o mais é forma, é "o que as pessoas aqui adoram". A realidade duplicada do universo, que consiste em objetos e espaço - materialidade e imaterialidade -, é igual à nossa. Uma vida humana sadia, equilibrada e produtiva é uma dança entre as duas dimensões que constituem a realidade: forma e espaço. A maioria das pessoas se identifica tanto com a dimensão da forma, com as percepções sensoriais, com os pensamentos e com as emoções, que a parte oculta essencial quase desaparece da sua vida. A identificação com a forma as mantém presas ao ego. Aquilo sobre o que pensamos a respeito, vemos, ouvimos, sentimos ou tocamos é apenas a metade da realidade, por assim dizer. E a forma. Nos ensinamentos de Jesus, isso é chamado simplesmente de "o mundo", enquanto a outra dimensão é "o reino dos Céus ou a vida eterna". Assim como o espaço permite que todas as coisas existam e assim como não poderia haver som sem o silêncio, nós não existiríamos sem a dimensão essencial sem forma que é a nossa essência. Poderíamos chamá-la de "Deus", caso essa palavra não estivesse tão desgastada pelo uso. Prefiro denominá-la Ser. O Ser é anterior à existência. A existência é forma, conteúdo, "o que acontece". A existência é o primeiro plano da vida, enquanto o Ser é uma espécie de pano de fundo. A doença coletiva da humanidade é o fato de as pessoas estarem tão absorvidas pelo que acontece, tão hipnotizadas pelo mundo das formas em constante mutação, tão mergulhadas no conteúdo da sua vida, que se esquecem da essência, daquilo que está além do conteúdo, da forma e do pensamento. Elas se encontram de tal maneira consumidas pelo tempo que se esquecem da eternidade, que é sua origem, seu lar, seu destino. Eternidade é viver a realidade de quem nós somos. Anos atrás, quando estive na China, visitei um monumento no alto de uma montanha próxima a Guilin. Nele havia uma inscrição gravada com ouro. Perguntei ao guia chinês o que estava escrito ali. - Está escrito "Buda" - disse ele. - Por que há dois ideogramas gravados em vez de um? - quis saber. - Um significa "homem". O outro significa "não". E os dois juntos significam "Buda" - explicou. Fiquei ali parado completamente perplexo. O ideograma correspondente a Buda já continha todo o ensinamento do mestre. E, para um bom entendedor, o segredo da vida. Ali estão as duas dimensões que constituem a realidade - materialidade e imaterialidade, forma e negação da forma - o que é um reconhecimento de que a forma não é quem nós somos.
Eckhart Tolle, O Despertar De Uma Nova Consciência.
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