30 de out. de 2014

O Criminoso é o Eleitor!


Você é o criminoso, ó Povo, já que é você o Soberano. É verdade, você é o criminoso inconsciente e ingênuo. Vota e não vê que você é vítima de si mesmo.

Contudo, não repara ainda por experiência própria que os deputados, que prometem lhe defender, como todos os governos do mundo presente e passado, são mentirosos e impotentes?

Você sabe e se queixa disso! Sabe e os elege! Os governantes, quem quer que sejam, trabalharam, trabalham e trabalharão pelos seus próprios interesses, pelos das suas castas e das suas máfias.

Onde foi e como poderia ser de maneira diferente? Os governados são subalternos e explorados: conhece algum que não seja?

Enquanto você não tiver compreendido que só cabe a você produzir e viver a seu modo, enquanto suportar – por medo – e fabricar – por crença na autoridade necessária – chefes e diretores, fica também sabendo, os seus eleitos e os teus senhores viverão do seu trabalho e da sua patetice. Você reclama de tudo! Mas não é você o autor dos mil males que te devoram?

Reclama da polícia, do exército, da justiça, dos quartéis, das prisões, das administrações, das leis, dos ministros, do governo, dos financeiros, dos especuladores, dos funcionários, dos patrões, dos padres, dos proprietários, dos salários, dos desempregados, do parlamento, dos impostos, dos fiscais da alfândega, dos possuidores de rendimentos, da carestia dos víveres, das rendas dos prédios decadentes e urbanos, dos longos dias de trabalho no escritório e na fábrica, da magra ração, das privações sem conta e da massa infinita das desigualdades sociais.

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A FARSA DO VOTO

Se queixa, mas quer a manutenção do sistema em que vegeta. Se revolta, por vezes, mas apenas para recomeçar sempre da mesma forma. É você que produz tudo, que lavra e semeia, que forja e tece, que amassa e transforma, que constrói e fabrica, que alimenta e fecunda! E você que legitima com a sua cédula de voto – e que nos impõe com a sua imbecilidade.

Porque não consome até à saciedade?

Porque é voce o mal vestido, o mal alimentado, o mal abrigado?

Sim, porque é o Zé Ninguém sem pão, sem sapatos, sem morada?

Porque não é o senhor de si mesmo? Porque se curva, obedece, serve? Porque é você o inferior, o humilhado, o ofendido, o servidor, o escravo?

Elabora tudo e nada possui? Tudo é por você, e você nada é.
Engano meu. Você é o eleitor, o maníaco do voto, o que aceita o que é; o que, pela cédula eleitoral, sanciona todas as misérias; o que, ao votar, consagra todas as suas servidões.

É o criado voluntário, o doméstico amável, o lacaio, o serviçal, o cão que lambe o chicote, que rasteja diante do pulso reto do dono. É o p2, o carcereiro e o bufão. É o bom soldado, o guarda modelo, o locatário benévolo. É o empregado fiel, o servidor dedicado, o camponês sóbrio, o operário resignado com a sua própria escravatura. É o carrasco de si mesmo. Do que está a reclamar?

É um perigo para nós, homens livres, para nós, anarquistas. É um perigo de igual modo que os tiranos, os senhores que você cria para si próprio, que elege, que apoia, que alimenta, que protege com as suas armas, que defende com a sua força bruta, que exalta com a sua ignorância.

Você é bem o Soberano que bajula e leva nas costas. Os discursos te lisonjeiam. Vota bem!

Os cartazes prendem a sua atenção; você gosta das idiotices e que te façam a corte: te satisfaz, enquanto aguarda que te fuzilem nas colônias, te massacrem nas fronteiras, à sombra ensanguentada da sua bandeira.

Se línguas interesseiras lambem à volta da tua real bosta, ó Soberano!; se candidatos sedentos de posições de chefia e cheios de banalidades escovam o espinhaço e a garupa da tua autocracia de papel; se você se embebeda com os elogios e as promessas que jogam sobre ti os que sempre te traíram, te enganam e irão te vender amanhã: é porque você se parece com eles. É porque não vale mais que a horda dos seus bajuladores esfomeados. É porque, não tendo podido elevar sua consciência sobre sua individualidade e sua independência, é incapaz de se emancipar por si mesmo. Não quer, portanto, não pode ser livre.

Vamos,
Confia nos teus mandatários, acredita nos teus eleitos.
Mas pára de reclamar. As ordens que você aguenta, é você mesmo que te impõe. Os crimes do qual é vítima, é você mesmo que comete.

Nós, saturados da opressão dos senhores que você escolhe, saturados de suportar a sua arrogância, saturados de suportar a sua passividade, vimos te chamar à reflexão, à ação:
Vamos, tenha um bom movimento:

Se livra deste hábito estreito da legislação, lava o seu corpo rudemente, a fim de que acabem os parasitas e os vermes que te devoram.

Só então poderá viver plenamente.

Originalmente publicado na revista L’Anarchie, em 1 de Março de 1906.

http://quoduniomystica.blogspot.com.br/

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