Nas redes sociais, 15 milhões de pessoas acompanharam as postagens sobre a entrevista de Lula ao JN, mais do que a audiência de Bolsonaro, que foi de nove milhões
Daí para a frente, Lula ficou à vontade, ora sorridente, ora veemente, respondendo às perguntas de acordo com sua conveniência. Algumas vezes, tergiversou; outras, mandou recados aos diferentes públicos que pretende seduzir na campanha eleitoral. Foi o caso da nomeação do novo procurador-geral da República, caso seja eleito. O petista deixou no ar se aceitará a lista tríplice tradicionalmente eleita pelos procuradores, como fez durante seu governo. Sem nunca perder a elegância, foi mais atencioso com Renata Vasconcellos do que com Bonner. O Lula ressentido dos palanques eleitorais deu lugar à nova versão do Lulinha Paz e Amor, 20 anos depois. O petista estava de bem com a vida e convicto de que sua volta ao poder, em parceria com o ex-tucano Geraldo Alckmin, é a chave para resolver os problemas do país.
Não concordo com a tese de que os jornalistas refrescaram deliberadamente Lula, apenas não tiveram oportunidade de confrontá-lo como fizeram com Bolsonaro, porque Lula foi muito esperto e estava preparado para vender seu peixe com competência. Fez isso de forma menos propositiva do que Ciro Gomes, por exemplo, mas muito eficiente para resgatar seu legado como presidente da República por dois mandatos, que deixou o governo com altos índices de aprovação. O caminho crítico era a Operação Lava-Jato, mas esse tema Lula tratou como um erro judicial, da qual foi vítima, o que muda a natureza de sua prisão. Aproveitou para desqualificar o ex-juiz Sergio Moro, que o sentenciou à prisão, e só faltou bater no peito para dizer que seu governo criou condições para todas as investigações da Lava-Jato, ao fortalecer os órgãos de controle e não interferir na Polícia Federal nem no Ministério Público Federal.
Quando questionado sobre o mensalão, derivou para a crítica ao chamado orçamento secreto, no valor de R$ 16 bilhões. Aproveitou a oportunidade para fustigar Bolsonaro, que chamou de "bobo da corte". Disse que o atual presidente da República entregou o Orçamento da União ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que libera o pagamento das emendas parlamentares diretamente com os ministros. Lula defendeu a ex-presidente Dilma Rousseff, mas dela manteve distância regulamentar. Criticou os comunistas cubanos e chineses, demarcando território em relação à esquerda e encheu a bola do vice Geraldo Alckmin, para agradar aos eleitores de centro e mostrar que a polarização entre PT e PSDB era do bem, pois se tratavam como adversários, enquanto a luta do bem contra o mal preconizada por Bolsonaro seria de natureza fascista.
Caiu na rede
Visto por esse ângulo, Lula aproveitou a oportunidade para consolidar seu favoritismo nas eleições, mas as coisas não acontecem tão fácil assim. O resultado da entrevista não pode ser avaliado pelo desempenho de Lula frente aos jornalistas da TV Globo, apenas. Não, existe uma guerra de versões nas redes sociais. A imagem que Lula tentou construir não será exatamente a que gostaria, será o resultado do seu desempenho e das críticas dos bolsonaristas. Hoje, isso é mensurável nas redes sociais, embora a prova dos nove seja a pesquisa de opinião feita com os eleitores, em bases estatisticamente confiáveis.
Nas redes sociais, 15 milhões de pessoas acompanharam as postagens sobre a entrevista de Lula ao JN, mais do que a audiência de Bolsonaro, que foi de nove milhões. Lula teve boa aprovação ao defender a presença de Alckmin na sua chapa. Também faturou quando criticou o ódio na política. Em contrapartida, as redes reagiram negativamente quando não respondeu sobre a lista tríplice e chamou Bolsonaro de "bobo da corte". Também se desgastou quando disse que a solução para o orçamento secreto era negociar com os deputados.
Segundo a Quaest Pesquisa, Lula teve 48% de menções positivas e 52% de negativas. Saiu-se melhor do que Bolsonaro, que teve 35% de aprovação, mas ficou aquém de Ciro Gomes, que somou 54%. Trocando em miúdos, a percepção de que Lula nadou de braçada na entrevista do JN é válida se examinarmos seu desempenho na tevê, mas isso não se traduz nas redes sociais, onde os bolsonaristas são muito mais organizados do que os petistas.
As próximas pesquisas de opinião nos dirão se as entrevistas provocaram alguma alteração do quadro eleitoral. Amanhã, comento o desempenho de Simone Tebet (MDB) ontem à noite, no Jornal Nacional.
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